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sábado, 15 de outubro de 2016

Todos os tratamentos e medicamentos para constipação intestinal, obstrução intestinal e prisão de ventre

Constipação intestinal é prevalente. O tratamento da orgânica é voltado para a causa. A etiologia da constipação funcional não é conhecida e o tratamento clínico envolve correção comportamental e medicamentos. Essas medidas podem ser aplicadas de forma associada, a relevância é para a correção de hábitos inadequados. Laxantes podem ter pronto efeito, mas não definitivo. A opção de fármacos tem aumentado, mas ainda esperamos a satisfação plena com o tratamento da constipação intestinal. Constipação intestinal, obstipação intestinal ou prisão de ventre são sinônimas. Frequência das evacuações é uma das características. Peso das fezes, apesar de também objetivo, não é prático. Outros critérios são subjetivos.
Hábito intestinal normal envolve necessariamente: a) eliminação de fezes sólidas ou pastosas, cilíndricas ou amórficas, sem muco, pus, sangue ou restos alimentares; e b) evacuações três vezes por dia até três vezes por semana, sem desconforto pélvico ou abdominal e com satisfação (sensação de eliminação completa das fezes). 
Constipação implica na presença de pelo menos um dos seguintes:
· Fezes duras, fragmentadas, ressecadas e em pequeno volume;
· Evacuação a intervalos superiores a três vezes por semana;
· Evacuação incompleta ou insatisfatória;
· Esforço demasiado, dificuldade ou necessidade de manobras para evacuar (remoção digital das fezes ou pressão sobre o períneo ou vagina);
· Dor anorretal ou perineal para evacuar;
· Dor ou desconforto abdominal que se resolve com evacuação.
Constipação se refere a sintoma(s). Várias são as condições determinantes.
Um quinto da população apresenta constipação intestinal, em algum momento da vida. Na maioria dos casos não debilita o indivíduo, nem ameaça a vida.
Associação pode não ser causal, mas vários são os fatores de risco: gênero feminino, envelhecimento, depressão, sedentarismo, alimentação, baixa renda e nível educativo, medicamentos, abuso físico e sexual. No século 20, com a industrialização, houve redução da ingestão de vegetais, do volume fecal e do estímulo retal para a evacuação. Condições predisponentes como viagens, gravidez tardia e morbidades tratáveis, antes fatais, tornaram-se comuns. Redução das refeições (pré-abolição do desjejum) leva a prejuízo do reflexo gastroenterocólico. Também inibido quando ocorre em momento inadequado, mediante contração voluntária do esfíncter anal externo. Negação repetitiva do reflexo é acompanhada da perda progressiva da sensibilidade retal à distensão pelas fezes, agravando ou desencadeando a constipação. Modific. de World Gastroenterology Organisation. Practice Guidelines. Constipação: uma perspectiva mundial, 2010.

Constipação intestinal pode ser aguda ou crônica, sendo duas semanas o limite. Várias são as classificações. A mais empregada abaixo é citada:
· Constipação orgânica ou secundária: constipação é sintoma, presente quando de alteração morfológica, metabólica; sistêmica, efeito medicamentoso e/ou gravidez. Tem origem digestiva ou extradigestiva (Tabela 1);
· Constipação funcional ou primária: constipação é o único sintoma; constipação é a doença. Tem maior prevalência e a evolução é, geralmente, prolongada. Resulta de retardo do trânsito colônico (inércia colônica), que decorre de: 1. erro alimentar (redução de refeições e/ou do conteúdo de fibras) ou da diminuição numérica das células intersticiais de Cajal (marcapassos do intestino) ou de alteração de hormônios ou neurotransmissores entéricos; 2. dificuldade do esvaziamento retal, por negação repetitiva do reflexo de evacuação ou dissinergia anorretal: condição menos prevalente, que decorre da disfunção do assoalho pélvico.
Medicamentos desencadeiam ou agravam a constipação. A população idosa é a que mais usa medicamentos e, portanto, a mais vulnerável. Os mais envolvidos são apontados na Tabela 2. Modific. de World Gastroenterology Organisation. Practice Guidelines. Constipação: uma perspectiva mundial, 2010. Figura 1 - Escala de Bristol (consistência das fezes).

Diagnóstico clínico
A avaliação clínica dos pacientes com constipação deve identificar sintomas de alarme e a possível causa. A Escala Bristol, mostrada na Figura 1, presta-se a ajudar os pacientes a descrever a consistência do bolo fecal (Lewis et al., 1997).
Também deve ser:
· Verificada a presença de elementos anormais nas fezes (sangue, muco, pus);
· Caracterizadas as evacuações (esforço, satisfação) e os sintomas (dor, distensão ou desconforto abdominal);
· Obtido histórico do uso de medicações, especialmente dos laxantes;
· Avaliada condição atual, histórico médico, cirurgias, doença psiquiátrica, estilo de vida, atividade física, alimentação e ingestão de líquidos;
· Afastadas situações de alarme: alteração no calibre das fezes, sangramento (manifesto ou oculto), anemia, emagrecimento, sintomas obstrutivos, constipação de recente instalação, pacientes maiores de 50 anos não submetidos à triagem prévia para câncer de cólon (colonoscopia).
A avaliação física deverá afastar tumoração abdominal e impactação fecal, estenose, prolapso retal, retocele, tumor, músculo puborretal contraído (exame proctológico).
Se indicados, deverá ser feito perfil bioquímico, hemograma, cálcio, glicose e função tireoidiana. Exame subsidiário (por imagem, endoscopia ou teste funcional) está indicado nos pacientes com constipação crônica severa ou sintomas de alarme. A investigação complementar decorrerá da clínica e da hipótese diagnóstica. Paciente com menos de 50 anos, sem comorbidade, sintomas e sinais de alarme, que não realiza manobra para esvaziar o reto, provavelmente tem constipação funcional. Se a história apontar para inadequação alimentar, da atividade física ou da resposta ao reflexo gastrocólico se prescinde de exames, passando à terapêutica.
Testes fisiológicos para avaliação da constipação crônica (Rao, 2009) envolvem manometria, teste de expulsão de balão e trânsito colônico. Manometria anorretal avalia sensibilidade retal, alteração de complacência. Teste de expulsão de balão avalia a capacidade do paciente de expulsar fezes simuladas. Trânsito colônico é feito mediante radiografia simples de abdome, após 120 horas da ingestão de marcadores radiopacos. Persistindo mais de 20% dos marcadores, o trânsito está retardado. O acúmulo distal indica transtorno da evacuação e, nos casos de constipação por trânsito lento, quase todos os marcadores se mantêm no cólon direito e no esquerdo. Nem sempre são disponíveis no comércio, mas podem ser obtidos a partir do corte de um tubo radiopaco, em pedaços de 2 a 3 mm de longitude, não apresentando riscos para o paciente. Os marcadores (de 20 a 24) podem ser colocados em cápsula de gelatina para facilitar a ingestão.
Defecografia é útil para descartar desordem evacuatória, quando o teste de expulsão do balão e a manometria anorretal forneceram resultados inconclusivos.

Tratamento clínico
A investigação e terapêutica são diversas para constipação intestinal orgânica ou funcional e se aplicadas com atraso podem deixar de proporcionar a cura. Cabe adequada exploração dos dados clínicos para a indispensável distinção.
Objetiva-se neste artigo a abordagem de adultos com constipação funcional, uma vez que a constipação orgânica tem terapêutica voltada para a causa. Abuso físico ou sexual, perdas, insatisfação pessoal, fobia, repulsa pelo ato de evacuar, depressão requerem terapêutica mais abrangente.
O tratamento clínico da constipação funcional envolve correção comportamental e medicamentos. Essas medidas podem ser aplicadas de forma associada, a relevância é para a correção de hábitos inadequados. Quando necessário, medicamento se deve vislumbrar futuro desmame, apesar de nem sempre ser possível. Não é fácil mudar hábitos. Novas atitudes podem não produzir resultados na rapidez com que são esperados. Laxantes podem ter pronto efeito, mas não definitivo.
Complicações da constipação como impactação fecal, fecaloma, pseudodiarreia, úlcera estercoral, volvo e perfuração intestinal, são mais comuns nos pacientes com megacólon ou megarreto. Fissura e prolapso retal são outras condições desencadeadas pela constipação. O tratamento adequado da constipação intestinal evita tais complicações.
1. Correção de hábitos
Erro alimentar é condição muito frequente, destacando-se ingestão insuficiente de líquido e/ou de fibras, longo período interprandial e abolição de uma das três principais refeições diárias. Em relação aos alimentos se enfatiza para a ingestão de fibras alimentares, presentes nas hortaliças, legumes, leguminosas, cereais e frutas.
Mudança de rotina alimentar, por compromissos familiares, sociais ou profissionais, especialmente por ocasião de viagens, pode ser determinante. Assim como a negação do reflexo evacuatório, por pudor, falta de tempo, treinamento coercitivo ou indisponibilidade de sanitário. Deficiente pressão abdominal por fraqueza da musculatura abdominal e/ou pélvica contribui, particularmente, em sedentários, acamados ou idosos. Para crianças, falta de apoio para os pés ou inadequação de assento sanitário pode ser o problema. Sedentarismo precisa ser abolido, atividade física per si pode regularizar o hábito intestinal.
Ler, rever agenda, fumar, telefonar ou digitar pode comprometer os mecanismos voluntários da evacuação. Para alguns, esta associação cria condicionamentos com bom resultado, não devendo ser desestimulada. Mas, quando se pretende restabelecer o funcionamento intestinal regular, a distração no momento da evacuação prejudica.
O paciente, de acordo com sua disponibilidade, deve escolher o momento apropriado para disciplinar o aparecimento do reflexo evacuatório, obrigando-se a fazê-lo diariamente, sem a concorrência de outros compromissos e evitando distração. Dedicar-se ao ato da evacuação é indispensável para o sucesso da reeducação. O condicionamento do reflexo somente ocorrerá após duas a três semanas de treinamento.

2. Farmacoterapia
Significativos avanços no tratamento farmacológico da constipação, todavia, nem médicos, nem pacientes estão totalmente satisfeitos.
Laxativo ou laxante promove evacuação de fezes do reto. Catártico promove evacuação de fezes não formadas, oriundas de qualquer porção do intestino grosso. Neste artigo se emprega os primeiros, independentemente da diferença.
Dispomos de vários agentes laxantes (Tabela 3). Produtos comerciais associam diferentes grupos de drogas, com finalidade de potencializar seus efeitos, mas essa opção não deve ser a de regra. Em geral, o tratamento da constipação é encarado pelos doentes como ato de simples prescrição de laxativo. Isso faz com que procurem médico frustrados com automedicação, prolongada e abusiva. Vários laxantes podem ser aplicados por via retal, o que deve ser considerado como conduta emergencial. Seu emprego de rotina é excepcional, todavia, especialmente em idosos, pode constituir única forma de estímulo para evacuação, evitando a impactação fecal.
a. Laxante formador de massa ou agente hidrofílico
Produtos com fibras naturais à base de Psyllium ou com fibras sintéticas são utilizados quando não se conseguiu aumentar o teor de fibras na dieta. Seu mecanismo de ação se baseia na retenção de líquido e aumento da massa fecal. Levam de um a três dias para ter efeito.
Podem determinar flatulência, distensão e empachamento abdominal. Estão contraindicados quando de impactação fecal, megacólon ou obstrução intestinal. Devem ser evitados para idosos, dada a hipomotilidade intestinal nesse grupo etário.
b. Laxante estimulante, irritante ou de contato
Atua mediante estímulo de neurônios, enterócitos e do músculo liso, levando à aceleração do trânsito e ao aumento de teor hídrico fecal, por alteração de absorção ou secreção. Possui efeito laxativo rápido: leva seis a oito horas para ter efeito por via oral.
Inconveniente, quando do uso prolongado, leva a taquifilaxia e a destruição das terminações nervosas do cólon. Leva à melanose colônica, ao cólon catártico e a dor abdominal. Não raro, pacientes se frustram com a prolongada expectativa de efeito da automedicação e agravam o quadro com o abuso de laxativos de contato.
No grupo dos difenilmetanos há bisacodil, picossulfato de sódio e oxifenizatina; no das antraquinonas, Senne e cáscara sagrada.
C. Laxante osmótico
Atua mediante retenção de fluidos no intestino. Leva três a seis horas para atuar por via oral.
Dos salinos, o "sal amargo" é o mais antigo e menos utilizado e o leite de magnésia (hidróxido de magnésio), muito utilizado, contraindicado para portadores renais crônicos.
Laxativos à base de açúcares não absorvíveis (lactulose, sorbitol, manitol, lactitol, polietileno glicol, macrogol) são muito empregados, inicialmente para encefalopatia hepática, preparo de colonoscopia ou cirurgia, posteriormente para tratamento da constipação intestinal. Particularmente indicados para grávidas e idosos. Qualquer deles determina flatulência, cólica ou diarreia.
d. Laxante surfactante ou emoliente
Facilita a interface entre componentes hidrofílicos e hidrofóbicos da massa fecal levando ao amolecimento do bolo fecal. O efeito ocorre em um a três dias. Seu uso básico visa evitar esforço para evacuar, como na recuperação de infarto do miocárdio ou após cirurgias. Os docusatos provocam um aumento na secreção de sódio, cloro e água, podendo causar desequilíbrio hidroeletrolítico, motivo pelo qual seu uso deve ser de curta duração.
e. Laxante lubrificante
Os óleos minerais têm função lubrificante. São muito utilizados e usualmente não causam complicações.
Se aspirados para a via respiratória, especialmente por crianças e idosos com doença do refluxo gastroesofágico, ocasionam pneumonia gordurosa. Seu emprego prolongado, superior a um ano, pode contribuir para a má absorção de vitaminas lipossolúveis.
f. Prucaloprida
Dos agentes procinéticos, cisaprida tinha efeitos intestinais mais satisfatórios, todavia foi retirada do mercado, dados os efeitos cardíacos. Agonista da serotonina, prucalopride, disponível na Inglaterra e Estados Unidos há muitos anos, foi recentemente introduzida no país, nas apresentações de 1 ou 2 mg por comprimido.
g. Outros medicamentos com ação laxativa
Colerético, levando ao aumento de bile no intestino, que irrita a mucosa colônica, é opção muito utilizada, especialmente os derivados da alcachofra.
Eritromicina, com ação semelhante à da motilina e colchicina, embora úteis no tratamento de formas refratárias de constipação, não têm ampla aceitação.
Orlistate, ao impedir a absorção de gordura, tem efeito laxativo, desde que esse componente seja ingerido.
Misoprostol, prostaglandina sintética, tem uso restrito, dado o efeito abortivo e dificuldade de aquisição.
Prostigmine, agente musculotrópico colinérgico, há muito tempo utilizado, tem potente ação e é indicado especialmente quando de neuropatia e pós-operatório de cirurgia abdominal.
Metilnaltrexona, antagonista de receptor opioide, tem indicação nos casos de intoxicação opiácea.
Através dos canais de cloro das células epiteliais ocorre transferência ativa do íon para a luz dos intestinos, por difusão, sódio e água restabelecem o equilíbrio. O trânsito intestinal e colônico são afetados pela quantidade de líquido secretado. Lubriprostona foi aprovada pelo FDA, em 2006, e é comercializada nos EUA. É alternativa dispendiosa e ainda não disponível no país. Tem indicação para síndrome do intestino irritável-C e constipação crônica, na dose de 8 mg, duas vezes ao dia. Efeitos adversos incluem náusea, diarreia e/ou distensão abdominal.
Linaclotide, peptídeo de 14 aminoácidos, agonista da guanalitato ciclase, estimula o fluxo de água e eletrólitos para a luz dos intestinos delgado e grosso, aqui não disponível. Dose usual é única, de 290 mcg (um comprimido).
Elobixibat bloqueia absorção de sais biliares no íleo terminal, induzindo aumento de secreção e de motilidade colônica.
Além de pré e probióticos já em utilização, muitos são os produtos em pesquisa.
Apesar do progresso, médicos e pacientes ainda não estão satisfeitos e melhores resultados são almejados. Editor Paulo Gomes.

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